02 agosto 2019

Abrindo caminhos para a Vida: a proteção da biodiversidade

O modo como pensamos e compreendemos o mundo pode fazer muita diferença, para nós mesmos e para o próprio mundo. Ou seja, para a realidade das pessoas e dos demais seres da natureza que partilham esse mesmo mundo conosco. Há cerca de duas ou três décadas, as expressões “network”, “web”, “hub”, “rede”, entre outras, não seriam compreendidas como hoje as percebemos, como espaços e práticas de interlocução em rede, coletiva, de múltiplas origens e mesmo global.

Com relação à natureza, no entanto, parece que continuamos a pensá-la como algo inerte e que pode ser recortada, isolada, sem sofrer perdas com isso.

Pior, estamos crentes de que podemos substituir a natureza com produtos criados tecnologicamente, artificializando todos os espaços de vida, do habitat aos alimentos. Mas essa pretensão não é coerente com o fato de que nós, seres humanos, também somos seres vivos e fazemos parte dessa “rede” viva com os demais seres e com a natureza. Queiramos ou não, estamos intrinsecamente vinculados aos processos vitais que se articulam no planeta.

O descompromisso coletivo tem colaborado para a perda massiva de biodiversidade e, mesmo sem o saber, para o aumento da temperatura do planeta.

Não podemos pensar de forma egoísta a respeito da vida. A agressão que fazemos à natureza reverterá contra as gerações humanas futuras: as nossas crianças e jovens, e os que ainda nem nasceram. É a respeito dessas atitudes – de descaso e irresponsabilidade para com a vida no planeta – que movimentos como as greves e passeatas estudantis do movimento “Fridays for Future” vem alertando.1 Não temos o direito de deixar para as futuras gerações uma herança de solos contaminados, escassez hídrica e insegurança alimentar, pois essas serão as consequências caso não protejamos as condições de manutenção do equilíbrio ecológico do planeta.

Pensar a natureza como uma teia/rede de agentes e fatores que permitem à vida se desenvolver, nos faz perceber que tudo o que a ameaça, dificulta, interrompe, reduz, certamente prejudica a todos coletivamente, humanidade e natureza. Proteger e criar caminhos para a vida – e isso não é uma metáfora – requer medidas práticas, com as quais todos podemos contribuir. A proteção dos ecossistemas pode ser feita de muitas maneiras, mas há alguns aspectos que têm importância destacada para que a vida flua, cuidando dos seus caminhos: a preservação das nascentes e mananciais e a manutenção ou restauração de corredores ecológicos.

Onde existe água, existe presença de vida. A água limpa proporciona abundância de vida, que desabrocha no próprio ambiente aquático, favorecendo à flora e à fauna dos rios e mares, como também para todo o restante do ecossistema. Quando compreendemos os rios contextualizados em suas bacias hidrográficas, por exemplo, temos uma ideia mais clara do que significa a água para um bioma, para uma região, o que ela significa de vitalidade para o solo, para a vegetação, para os bosques e florestas, e os seres que habitam esses espaços.

Sabemos bem que, em períodos de poucas chuvas, os mananciais baixam nível de água e as torneiras secam, e, considerando a dependência que temos da energia das usinas hidrelétricas, as crises mais sérias ainda devem afetar o fornecimento de energia (ficaremos sem eletricidade, sem internet e serviços que dependem desses sistemas: sem água mesmo onde haja água, pois o bombeamento depende de energia, sem condições sanitárias, etc)2. Essas condições caóticas já vêm ocorrendo em algumas regiões e colocam grandes metrópoles em situação de emergência.

Portanto, proteger as nascentes de toda poluição (produtos químicos principalmente), manter largas faixas de vegetação ao redor dos cursos de água, pode fazer toda a diferença para a proteção da vida e da qualidade ambiental de que todos necessitamos. No mesmo sentido, com relação às águas do mar. Esgoto e resíduos lançados ao mar – sem falar na quantidade absurda de resíduos e descartes de produtos industrializados, principalmente de plástico – estão matando a vida nesses espaços e os resultados podem ser catastróficos3.

Outro fator que é de grande relevância para o equilíbrio dos ecossistêmico é a existência de corredores ecológicos4 . Os corredores ecológicos são os caminhos que permitem o trânsito dos animais silvestres, beneficiando flora e fauna, com a polinização dos vegetais e a reprodução das espécies. A ausência dessa formação de redes interligando os espaços naturais resulta na impossibilidade de que animais se desloquem em segurança e, com isso, poderem buscar alimentos e habitats propícios para se desenvolver e encontrar outros da mesma espécie para se reproduzir.

Esses corredores se constituem em espaços de vegetação às margens dos rios e interligando bosques e florestas. As áreas de proteção permanente 5 e de reserva legal 6 , como as áreas de montanha e margens de rios, entre outros, são espaços de ambiente natural para resguardar os ecossistemas. Por isso, devem ser protegidas e preservadas. O mesmo vale para as áreas verdes que devem ser mantidas nos sítios e fazendas utilizados para agricultura e pecuária. É importante que sejam espaçosas o suficiente para preservar o bioma, e que estejam interligadas em forma de corredores ecológicos, para que não se interrompam os caminhos da vida, que é a função da biodiversidade.

Espécies ameaçadas de extinção como os grandes felinos 7 e as araucárias 8, próprios da região sul do Brasil, são apenas um alerta sobre a gravidade que representa deixar de pensar o mundo como um sistema vivo, interligado e interdependente. Podemos fazer a nossa parte, e a hora é agora.

Um bom modo de começar é pela busca e disseminação do conhecimento acerca desses assuntos. Saber de onde vem a água que abastece a nossa cidade, promover mutirões de limpeza e reconstituição da vegetação ao redor desses rios; adotar as práticas corretas de separação e destinação de resíduos na própria casa, condomínio e município; promover a revitalização dos espaços verdes na cidade e no campo, para que a flora e a fauna possam repovoar esses ambientes: estas são atitudes mais do que necessárias, e que todos podemos assumir desde já.

Referências:

  1. https://www.uol.com.br/universa/noticias/bbc/2019/04/23/greta-thunberg-a-adolescente-sueca-que-esta-sacudindo-a-luta-ambiental.htm
  2. https://oglobo.globo.com/sociedade/sustentabilidade/brasil-pode-enfrentar-nova-crise-hidrica-por-anomalia-no-clima-diz-orgao-responsavel-por-alertas-de-desastres-23393453
  3. https://exame.abril.com.br/economia/poluicao-dos-oceanos-por-plastico-custa-ao-mundo-us25-trilhoes-por-ano/
  4. https://www.mma.gov.br/areas-protegidas/instrumentos-de-gestao/corredores-ecologicos
  5. https://www.oeco.org.br/dicionario-ambiental/27468-o-que-e-uma-area-de-preservacao-permanente/
  6. https://www.oeco.org.br/dicionario-ambiental/27492-o-que-e-reserva-legal/
  7. https://g1.globo.com/natureza/desafio-natureza/noticia/2019/02/21/maior-felino-das-americas-a-onca-pintada-esta-criticamente-ameacada-de-extincao-na-caatinga.ghtml
  8. https://epoca.globo.com/ciencia-e-meio-ambiente/blog-do-planeta/noticia/2017/06/por-que-araucaria-esta-ameacada-de-extincao.html