04 dezembro 2019

As vozes do mundo

A nossa compreensão sobre o que acontece ao redor está diretamente relacionada à atenção e percepção de quem ou o que se comunica conosco. É certo e claro que o entendimento entre seres humanos acontece mesmo sem a linguagem verbal, mas pela expressão facial e corporal, como acontece entre pessoas que não falam a mesma língua ou que usam a linguagem de sinais em função da surdez, por exemplo. É um processo que exige interesse, atenção, boa vontade, compreensão, mas que torna possível superar obstáculos e promover um diálogo amplo e plural sobre o mundo desse outro que é diferente do nosso.

Esse outro pode ser uma pessoa que veio de um país distante, com hábitos e valores próprios que diferem do que pensamos; pode ser alguém que vem de uma realidade bastante diversa da nossa, que passou por desafios diferentes e alegrias que nunca experimentamos; pode ser quem tenha crenças diferentes das nossas e sua fé seja tão forte e valorosa quanto as da religião que acolhemos, ou mesmo quem não assuma nenhuma religião; ou pode, enfim, ser alguém que vive uma situação precária, que está exposto a riscos e limitações com as quais nunca convivemos, ou ainda quem nunca tenha passado por situações de tristeza e dor. Um outro será, sempre, um diferente e, nessa diferença, tão próximo e semelhante a nós mesmos – mas é com ele que realmente aprenderemos sobre sermos mais humanos.

Também os seres da natureza são diferentes – e igualmente próximos – em relação a nós. Animais e plantas são seres sensíveis que, tal como nós, dependem de nutrientes e do equilíbrio ecossistêmico para realizarem suas funções vitais. Temos compromisso também com esses outros que habitam conosco a mesma “casa” planetária. Por isso, precisamos ser capazes de “ouvi-los”, compreendê-los em suas manifestações.

Um mundo ecologicamente sustentável depende de sabermos dar voz às diferentes pessoas e seres que o habitam, ter respeito e consideração pelas diferenças e promover interlocuções proveitosas para todos. Significa compreender que temos necessidades e interesses próprios e não idênticos, mas que uma existência na comunidade de vida terrestre exige de todos nós boa vontade e colaboração.

Quando falamos em crise ecológica, nos riscos de enfrentarmos situações de catástrofe e restrições, estamos pensando nesse coletivo extenso e complexo que coabita o planeta. Eventualmente nos confrontamos com as nossas próprias tragédias em contexto próximo, como quando de deslizamentos de terra, enxurradas, enchentes, que têm ocorrido em Santa Catarina e no Brasil, mas essa triste realidade e situações similares podem ser evitadas. Contudo, eventos dessa ordem, que têm acontecido com bastante frequência e intensidade em diferentes lugares do mundo, afetando pessoas que falam outras línguas e que têm outras tradições e pensamentos, mas que também nos dizem respeito.

A incapacidade ou a insensibilidade para perceber os danos que estamos causando à natureza reverte contra a própria humanidade, desestabilizando o nosso habitat e a nossa qualidade de vida. A insustentabilidade atual está colocando em ameaça a biodiversidade e, com ela, a própria segurança alimentar para a espécie humana, como denuncia o relatório da FAO – Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura. Os problemas não se restringem à produção alimentar, pois as crises hídricas causam migrações, desestabilizam comunidades, geram conflitos, catástrofes ecológicas provocam miséria e sofrimento, milhares de pessoas se vêm de uma hora para outra desalojadas de suas casas e suas vidas, além da instabilidade, a incerteza e o medo, que são motivos de aflição e causam problemas econômicos e sociais de longo prazo. 

Sustentabilidade é equilíbrio e esse equilíbrio tem como base os processos ecológicos responsáveis pela fertilização das plantas, a produção de oxigênio, as fontes de água potável, a estabilidade do clima, entre outros aspectos. Há muitos diferentes níveis de informação e comunicação na natureza e no ambiente humano, e é necessário dar voz, valor, reconhecimento às manifestações da natureza e da cultura para compreender e agir estrategicamente pela sustentabilidade de todos.